HomeBy Dady CheryCuba: Détente ou Trama Imperial da Doutrina Monroe?

By Dady Chery

Haiti Chery

Traduzido por Murilo Leme

Embora a Revolução Cubana tenha 57 anos de idade e seja usualmente responsabilizada pelo isolamento de Cuba, já se passaram 88 anos desde a última visita à ilha de chefe de estado dos Estados Unidos – US. O Presidente Obama, dos Estados Unidos, juntamente com membros de seu gabinete, inclusive o Secretário de Estado John Kerry, e grande delegação de legisladores, visitou Cuba de 20 a 22 de março de 2016. A visita anterior dos US a Cuba foi feita por Calvin Coolidge em janeiro de 1928, como parte da 6a. Conferência Panamericana. Naquele tempo Cuba e grande parte da América Central, inclusive Haiti, República Dominicana e Nicaragua estavam ocupadas pelos US. Coolidge havia ido para encomiar a pretensa soberania de Cuba e expressar apoio ao sanguinário ditador cliente Gerardo Machado. A Doutrina Monroe era à época escancarada e não envolta em capa de falso humanitarismo. Como Coolidge, Obama fez seu discurso no Grande Teatro de Havana.

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Os políticos dos US desta vez foram a Havana para remediar a embaraçosa situação em que seu país se meteu ao isolar-se ele próprio no decurso de suas tentativas de isolar Cuba. Em 2011, quando os US ainda estavam tentando excluir Cuba da Organização dos Estados Americanos (OAS), os países membros, sob o estímulo do ex-Presidente venezuelano Hugo Chavez, formaram um grupo alternativo: a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), que incluía Cuba mas excluía US e Canadá. Gradualmente, Cuba ganhou condição de membro, formal e informal mas sempre respeitoso, em mais e mais agrupamentos latino-americanos e caribenhos onde os US não eram bem-vindos.[1] Não se supunha que isso devesse acontecer. Depois da vitória da Revolução Cubana em janeiro de 1959, severo embargo comercial foi imposto a Cuba, não apenas pelos US, que era o maior parceiro comercial do país, mas também por aliados dos US. Isso deixou a nação-ilha sem até itens de primeira necessidade como pasta de dentes e papel higiênico. O embargo de medicamentos foi especialmente brutal porque conjugado com a saída de milhares de médicos cubanos do país só em 1959 e com o fato de o país não ter moeda estrangeira por causa da pilhagem do tesouro público pelo presidente cliente dos US Fulgencio Batista.

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Muitos cubanos morreram, mas não se agacharam desfazendo sua revolulção e rendendo-se aos US sob os termos mais desfavoráveis, ao contrário do esperado. A ascensão de Cuba como importante força criativa em saúde e biotecnologia começou com o despacho de missão médica ao Chile em 1960 para assistência a vítimas do Terremoto Valdivia de magnitude 9,5. Cuba também mudou o curso da geopolítica, começando com embarque de armamentos aos argelinos em 1961 durante a guerra deles contra o domínio colonial francês. Enquanto Cuba reconstruía sua classe média, aumentava também seu internacionalismo e sua assistência às vítimas de desastres naturais como furacões, e de horrores de autoria humana como o apartheid na África do Sul e a cólera no Haiti. Por cerca de 60 anos Cuba acumulou tal estoque de boa vontade que o rótulo de estado que patrocina terrorismo tornou-se universalmente desqualificado como relíquia da Guerra Fria. A Assembleia Geral das Nações Unidas votou esmagadoramente mais de 20 vezes em favor do fim do embargo. A votação de 2015 foi essencialmente unânime; 193 países votaram repudiando o embargo, sendo as únicas exceções US e Israel. Em vez de fracassar por causa do embargo, a revolução cubana triunfou graças a ele.

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Em contraste com Cuba, trajetória bastante diferente levou os US às reuniões de março de 2016 em Havana. Nos US, a decisão de reestabelecer relações com Cuba datou de cerca de 2007, quanto o escritório de advocacia de Atlanta e importante lobista em Washington Alston & Bird doou $33.000 dólares a candidato à presidência relativamente desconhecido durante os primeiros meses da campanha dele. Alston & Bird é firma gigantesca que faturou cerca de 645 milhões de dólares em 2014 e representa grupo de empresas de serviço financeiro, saúde, energia e telecomunicação.[2] O interesse dela no mercado cubano é forte o suficiente para, em 2006, seus advogados terem trabalhado pro bono para a American Civil Liberties Union (ACLU) [União Estadunidense pelas Liberdades Civis] em questionamento da proibição da Flórida de viagens a Cuba.[3] Como sempre nos US, as grandes empresas é que direcionam as políticas. O nova détente com Cuba agora meramente significa que o Sr. Obama esperou até os últimos meses de seu mandato para entregar o prometido em controversa promessa de campanha.

 

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A deitada dos alicerces para a visita estatal de março de 2016 levou dois anos de conversações intensivas. Embora Cuba tenha reclamado, por décadas, dos prejuízos decorrentes do embargo, não mais é país sem seu próprio papel higiênico ou medicamentos, e sim país que penosamente erigiu sua própria economia. Sua dura posição negociadora em relação às empresas dos US fica patenteada nas declarações de suas autoridades e nas ações dos US. Em 17 de dezembro de 2014, a decisão de restabelecer relações diplomáticas foi anunciada simultaneamente à libertação, pelos US, dos últimos três dos 5 prisioneiros cubanos. Outra concessão menos óbvia foi a renúncia do ex-Diretor da USAID, Rajiv Shah, que havia aparentemente tentado infiltrar o movimento hip-hop cubano e distribuiu um programa de mídia social chamado ZunZuneo para produzir propaganda antigovernamental. Em 10 de abril de 2015, com agora famoso aperto de mão, o Sr. Obama pessoalmente deu as boas-vindas ao Presidente cubano Raul Castro em reunião de cúpula da OAS. Ao chegar dezembro de 2015, os US haviam retirado Cuba da lista de países que patrocinam o terrorismo, John Kerry e outros membros do gabinete de Obama haviam visitado Havana, e o Ministro do Exterior cubano Bruno Rodriguez Parrilla havia visitado Washington.[4]

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A redução das sanções dos US tem sido bastante limitada em termos das restrições a comércio e investimento, embora série de medidas com valor de relações públicas tenha sido promulgada. Que inclui aumento das remessas permitidas para Cuba por trimestre de $500 para $2000 dólares, a restauração de voos diretos e serviço de correio, e relaxamento de viagens para visitas familiares, trabalho jornalístico, negócios governamentais, intercâmbio científico, educação, religião, intercâmbio cultural e esporte. Cuba, por outro lado, desde dezembro, soltou o empreiteiro da USAID Alan Gross e 53 prisioneiros políticos, inclusive o espião inflitrado da CIA Rolando Sarraff Trujillo, que se havia instilado no Ministério do Interior de Cuba.

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As negociações continuam. Cuba continua insatisfeita e cauta em relação aos US. Ao retornar aos US, Obama teve o gesto de grandeza de pedir ao Congresso que ponha fim ao embargo comercial; entretanto, Raul Castro e outros acreditam que, exceto na área de telecomunicações, o presidente dos US tem-se abstido de usar seus poderes executivos para ir adiante com o repúdio do bloqueio. Na reunião da CELAC de 28 de janeiro de 2015, o Sr. Castro disse:

“Continuam vigentes proibições de crédito e de uso do dólar em transações financeiras internacionais; viagens individuais de cidadãos dos US são dificultadas no sistema de licenças para os assim chamados intercâmbios people-to-people;[5] estes são condicionados por objetivos subversivos; e viagem marítima não é permitida.

“Permanecem vigentes proibições de aquisição, em outros mercados, de equipamento e tecnologia com mais de 10% de componentes estadunidenses, e de importação, pelos Estados Unidos, de bens contendo matéria-prima cubana, entre muitas, muitas outras.”
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Cuba vem também exigindo a devolução de Guantánamo, cujos alugueres recusa-se a receber desde 1959. “Enfatizei que o levantamento total do bloqueio, a devolução do ilegalmente ocupado território de Guantánamo, bem como pleno respeito pela soberania cubana, e indenização a nosso povo por danos humanos e econômicos, são cruciais para rumo de normalização de relações,” disse o Ministro do Exterior Bruno Rodriguez Parrilla. Nada obstante, os US continuam a comportar-se como se desejando a terra perpetuamente. Artigo capcioso no aluguel de Guantánamo diz que o contrato só pode ser terminado com o consentimento dos US ou de ambas as partes contratantes. Em outras palavras, para caírem fora de Guantánamo, tudo o de que os US necessitam é desejar fazê-lo. A remoção da base naval dos US e do odioso campo de prisioneiros contribuiria em muito para o estabelecimento de relações amigáveis com Cuba.[6]

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Ademais, em troca de abrir seus mercado aos US, Cuba deseja igual acesso ao mercado dos US. Atualmente, Cuba tem mais de 30 patentes na área de biotecnologia, que é sua principal exportação. Fabrica mais de 800 produtos para as necessidades de saúde dos cubanos, para os quais proporciona cobertura médica universal. Cuba gostaria de vender seus produtos biotech nos US e conduzir os necessários testes clínicos de produtos cubanos com pacientes dos US. Software de computador é também grande produto cubano. Empresa de propriedade do estado chamada Abel produz muito desse software, que é bastante difundido e vendido em América Latina, Espanha e Angola. Cuba tem produzido muitos jogos de computador, inclusive programa popular que ensina a jogar xadrez; tem produzido plataformas de telefone celular, bem como popular sistema operacional; e, naturalmente, tem produzido software para o setor de saúde, inclusive programas para captar e visualizar imagens digitalizadas para diagnóstico. Finalmente, Cuba deseja expandir sua indústria de turismo.  De cerca de 3,5 milhões de turistas em 2015, apenas 145.000 estadunidenses visitaram Cuba, e isso representou o dobro em comparação com 2014. É razoável esperar que esse setor cresça à medida que a facilidade de viajar para Cuba torne-se comparável a qualquer outra viagem no Caribe.

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Cuba tem tido experiência suficiente com a Doutrina Monroe para saber que o objetivo dos US será sempre transformá-la em colônia. Em 1959, esse processo era muito mais avançado em Cuba do que no Haiti. Embora mais de 30 por cento da população cubana fosse formada de pretos e mulatos, políticas Jim Crow vigoravam.[7] Cuba era Havana, agricultura comercial, e miséria, e Havana era cassino-bordel administrado por mafiosos dos US onde estadunidenses iam para pecar, e uma das principais ocupações das mulheres era prostituição, como agora na República Dominicana. A partir dessa situação de horror, no espaço de 57 anos Cuba conseguiu implantar assistência universal de saúde e remuneração igual para trabalho igual, como Raul Castro polidamente destacou sempre que Obama levantou a questão dos direitos humanos. Cuba também conseguiu implantar economia bastante diversificada que inclui muitos parceiros comerciais, inclusive tais como Rússia e Venezuela, que foram, ou ainda são, rejeitadas pelos US. Salta aos olhos que, sem sua revolução, Cuba seria hoje caso perdido/fracasso: muito pior do que Puerto Rico, que está à beira da bancarrota, e muito pior do que o Haiti, onde o erário está vazio e onde não mais há qualquer economia agrícola ou governo que faça jus a esse nome. As empresas estadunidenses de finança e telecomunicação desejarão controlar o fluxo de dinheiro e de informação o quanto possível, e tentarão explorar esse controle para pressionar Cuba a tomar decisões de política que a desestabilizem e a tornem dependente dos US. A nova onda de colonizadores deseja incrustar-se no cenário agora porque acha que sua obra de solapar a Revolução Cubana ficará mais fácil depois que o grande herói cubano Fidel Castro morrer. Isso é em parte resultado de crença dos US em sua própria propaganda, segundo a qual o Sr. Castro microgerencia tudo num país de 11 milhões de pessoas. Três gerações de cubanos competentes já cresceram desde a revolução, e deverá haver novas pessoas para conduzir esse projeto através de mais iterações.

7. Jim Crow – Políticas racistas e especialmente segregacionistas no final dos anos 1800 e início dos 1900, no sul dos Estados Unidos, tomadas coletivamente. V. wordsense.eu

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Ao os US cortejarem Cuba, a intenção estadunidense é claramente invasão da Baía dos Porcos com sorriso. A Revolução Cubana tem enorme importância simbólica para pessoas em todo o mundo que estão lutando contra o domínio dos US, e o desfazimento dessa revolução seria importante golpe psicológico. Os US já estão dando a entender desejarem eleições populares que possam manipular. Em discurso de 22 de março, o presidente dos US enfatizou que “Cuba tem sistema de partido único, [mas] os Estados Unidos são democracia de partidos múltiplos.” Isso é bastante risível, dada a subserviência de ambos os partidos dos US aos mesmos interesses empresariais, e a farsa que atualmente passa por ser eleição nos US. Em resposta a pergunta do repórter cubano-estadunidense Jim Acosta da CNN acerca de direitos humanos em Cuba, o Sr. Obama disse: “Encontrei-me com pessoas que têm sido sujeitadas a detenção arbitrária e isso é algo a respeito do que preciso falar, porque ouvi delas diretamente e sei o que significa para elas,” para gerar as manchetes convenientes, embora ele soubesse que, em preparação para a détente, Cuba havia libertado todos os 53 prisioneiros políticos de lista elaborada pelos US. Pergunta de encadeamento a Raul Castro foi por este respondida: “Dê-me um nome, ou nomes… e se tivermos esses prisioneiros políticos, serão libertados antes que a noite acabe.” No dia seguinte, em brilhante espetáculo de espírito aberto cubano, embaraçado Sr. Obama teve permissão para encontrar-se com grupo de dissidentes políticos cubanos de modo a poder coletar deles tantos nomes de prisioneiros quantos desejasse. Poucos países, inclusive os US, passariam no mesmo teste. Como sempre, a revolução cubana viceja quando está sob ataque; só podemos esperar que ela nunca imagine não estar.

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Notas

1. Respectful – Caracterizado por respeito, como ‘postura respectful,’ ‘postura respeitosa’. V. wordsense.eu

2. Grossed – To gross significa ganhar dinheiro, não incluindo despesas. Ganho bruto. ‘O filme grossed três milhões de dólares no primeiro fim de semana.’ Ver wordsense.eu

3. Pro bono – O trabalho pro bono público, ou pro bono, é um tipo de trabalho voluntário que, diferentemente do trabalho voluntário tradicional, implica que a atividade seja exercida com caráter e competências profissionais, não sendo, no entanto, remunerada. – Wikipédia.

4. E haviam cessado de chegar a minha caixa de correio eletrônico protestos contra o programa Mais Médicos, apesar da intensificação da campanha contra o governo, e de modo geral emails circulares de críticas e difamação de Cuba. Isso, estranhamente, no Brasil, país soberano e não envolvido nas gestões Estados Unidos – Cuba.

5. People-to-people – Aparentemente, significa as viagens de estadunidenses estarem condicionadas a encontros com cubanos estruturados de forma a haver influência mútua, da cultura cubana sobre estadunidenses, e da cultura estadunidense sobre a cubana. A viagem não tem característica de turismo e nem permite autonomia do viajante. Pelo menos foi o que entendi de http://www.ietravel.com/north-america-caribbean/cuba/faq/people-to-people-travel

6. O lado negativo, naturalmente, seria a remoção dos prisioneiros para locais mais inacessíveis do que Guantánamo, onde a tortura deles dificilmente seria flagrada, como os sítios tenebrosos da CIA espalhados pelo mundo.

Fontes: News Junkie Post | Dady Chery é o autor We Have Dared to Be Free [Temos Ousado Para Ser Livre]. | Fotografias um e sete por Ed Yourdon; dois por Burt Glinn; Quatro e nove por Bud Ellison; cinco do arquivo Witness Against Torture; seix e doze por Tom Graham; imagem composta de oito por Donkey Hotey; fotografias dez por Mike Keran, e onze por Dani.

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